quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

As experiências de um farmacêutico

Aos 86 anos de vida Benoni Silva dedicou mais de setenta à prática de farmácia, profissão celebrada na última quarta-feira (20/01): Dia do farmacêutico. Nessa longa jornada colecionou boas histórias, vendeu e criou os seus próprios remédios
Ainda com ruas centenárias de terra batida, recém elevada à condição de cidade, com casas de pau-a-pique, telhas feitas à mão Igaratá não tinha médico. A paisagem bucólica era cercada pelo ribeirão das Palmeiras que desaguava ali pertinho, no Jaguari.
Certo dia de 1954 o ônibus da Eroles parou defronte ao Bar do Amadeu e ali desceu, vindo da Capital, o jovem Benoni Silva, 25 anos. Dentro da mala, além das poucas peças de roupas, uma experiência de anos atuando como profissional de farmácia e a disposição de assumir a administração da primeira farmácia da velha Igaratá.
"Em 20 de janeiro é celebrado o dia do farmacêutico". 
Hoje Benoni mora com a mulher, Isabel Pereira Silva, 76, e cultiva netos e bisnetos em sua casa na Rua XV de Novembro, centro de Santa Isabel. Caminhando com o auxílio de uma bengala, apesar das pernas e mãos tremulas, tem voz e fala firme e com doses de precisão relata, como se revivesse, todos os dias, os momentos trabalhados nas farmácias de Minas Gerais e de São Paulo.
Nascido em São José dos Campos, Benoni mudou-se para Rio Piracicaba, cidade do interior de Minas Gerais, aos oito anos de idade, acompanhando o pai que era ferroviário na Central do Brasil. A mãe, morreu ainda cedo e Benoni, filho do meio, começou a trabalhar aos nove anos de idade na limpeza de uma farmácia próximo à sua casa. Já na adolescência ele largou a vassoura e tornou-se vendedor no recinto. Não demorou muito e Benoni começou a manipular no laboratório, os medicamentos que vendia.
Em destaque Benoni aos 23 anos,
na 1º turma do Curso de Oficiais de Farmácia de 1952,
em Rio Piracicaba – MG. 
O menino deixou o ensino médio para trás, depois que seu pai queria colocá-lo em um seminário: “Eu não queria ser padre, queria era namorar”, recorda sorrindo. Rio Piracicaba fica a cerca de 710 km de Belo Horizonte e quase 800 km de Ouro Preto, essas distâncias impediram Benoni de entrar na faculdade e tornar-se um profissional de farmácia formado. Hoje na prateleira de sua sala entre os porta-retratos da família, repousa a foto dele e da 1º turma do Curso de Oficiais de Farmácia de 1952, licenciado pelo Departamento de Saúde de Rio Piracicaba: “Com este curso, não me tornei um farmacêutico de formação, mas consegui a licença para atuar como profissional de farmácia”, ressalta. 
Quando já adulto, Benoni voltou para São Paulo, onde trabalhou em farmácias próximas as ruas São Bento e Praça da Sé: “Ali conheci um homem que tinha uma farmácia em Igaratá. Ele estava disposto a largar o ponto e me ofereceu, então eu aceitei e me mudei para lá”, diz.
Na velha Igaratá, Benoni se tornou o proprietário da farmácia Nossa Senhora das Graças, e lá ficou por seis anos: “Eu atendia pacientes que chegavam já com o receituário médico, mas havia muitas pessoas que, na falta de um médico, me procuravam para indicar a elas um remédio. Além de atender na farmácia eu era chamado durante as madrugadas para atender nas casas e, para chegar até os pacientes, ia a cavalo ou de charretes. Era uma aventura que hoje não existe mais”, recorda.
Benoni saiu de Igaratá antes que a cidade velha fosse engolida pelas águas da Represa Jaguari. Em 1960, mudou-se para Santa Isabel onde montou a Farmácia São Pedro, que existe até hoje na Rua João Pessoa, no centro da cidade. Aqui conheceu Isabel com quem teve os filhos Valesca, Adauani e Osni. Além da farmácia Benoni também foi atleta, no futebol era centroavante e tinha lugar garantido nos times da cidade, também representava o município nos jogos de vôlei. Na prateleira de sua sala, um troféu de 3º lugar na competição ocorrida em Nazaré Paulista em 1996, é a prova de que ele também era bom no voleibol.
Benoni hoje aos 86, em sua casa em Santa Isabel.

Benoni deixou de vez a farmácia no início dos anos 2000 e junto com a mulher divide a atenção dos cinco netos e três bisnetos. As mãos, hoje enrugadas, que começou varrendo farmácia, também criou expectorantes para a cura de tosse e até pomadas para manchas de pele, que sua mulher faz questão de dizer: “Foi a melhor pomada que alguém já inventou”.
Questionado sobre o que acha da profissão de farmacêutico nos dias de hoje, sua resposta é direta: “É capaz que a profissão de farmácia esteja melhor do que no meu tempo, mas é certo uma coisa, ela não te permite as mesmas aventuras que um dia eu vivi”, finaliza Benoni. 
 O texto foi originalmente publicado na Ed. 1.058 do Jornal Ouvidor e foi editado pelo jornalista Roberto Drumond. Clique Aqui e veja a matéria completa.